Maureen Bisilliat:
1985 - O Turista Aprendiz
São Paulo
Abertura:
23 de agosto, 2025 / 10h–16h
Período de visitação:
23 de agosto a 26 de setembro, 2025
Esta exposição começa com uma viagem. Uma viagem realizada em 1927 que teve muitos desdobramentos no tempo e formas no espaço. Ela se desdobrou em diários, livros, fotografias, filmes, outras exposições e outras viagens. A história começa com Mário de Andrade, que, como parte de suas pesquisas sobre o folclore e a cultura popular brasileira, percorreu o Norte e o Nordeste do país entre os anos de 1927 e 1928-1929, atento aos seus modos de vida e às suas manifestações culturais e religiosas. Sendo também poeta e escritor, registrou as impressões dessas viagens em diários de bordo. Um espaço íntimo que tornaria-se público 20 anos depois, quando editado em formato livro sob o título “O Turista Aprendiz”. Além do texto, Mário de Andrade também fez uso da imagem, registrando com sua máquina Kodak seus instantes de trabalho e lazer em mais de 500 fotografias.
É assim que, no início da década de 1980, tendo esse livro em mãos, Maureen Bisilliat retoma os escritos do turista aprendiz, e se propõe a refazer algumas daquelas viagens. Junto a Dorian Taterka e Lúcio Kodato, Bisilliat percorre, durante cinco semanas, igarapés, igapós e imensidões aquáticas do Amazonas/Solimões, de Belém a Manaus pelo Rio Amazonas e até Porto Velho pelo Rio Madeira. Registra em foto e em vídeo uma variedade de ritos, festividades, modos de trabalho e de descanso, paisagens e arquiteturas, indumentárias, rostos de gente, plantas e animais. Além da imagem, Bisilliat também faz uso da palavra, e escolhe o diário de bordo como formato que lhe permite estabelecer um vínculo com o livro de Mário de Andrade e uma comunicação com seu neto Nicholas, a quem a escrita se endereçava.
A proposta de Maureen Bisilliat de fazer uma releitura do percurso de Mário de Andrade formava parte de um projeto maior: a apresentação de uma Sala Especial dedicada ao Turista Aprendiz na 18ª edição da Bienal de São Paulo. Em 1985, a viagem de 1927 que já tinha dado origem a livros, filmes e fotografias, ganharia a forma de uma exposição. Junto ao amigo e arquiteto Antonio Marcos Silva, Bisilliat concebeu o espaço expositivo como uma sala escura que remetia ao negro dos rios e uma expografia sinuosa que remetia às suas curvas. Era uma grande instalação composta por fotografias, indumentárias e artefatos populares relacionados a ritos sagrados e profanos. Além do filme “Decantando as águas – O turista aprendiz revisitado” e das cerca de 400 fotografias realizadas por Maureen Bisilliat, foram apresentadas 50 fotografias realizadas por Mário de Andrade entre os anos de 1927 e 1929 acompanhadas por alguns trechos de seu diário. As fotografias de Bisilliat apresentadas naquela ocasião abandonavam a dualidade do preto e branco e davam conta de explorar a ampla gama de cores que compõem a diversidade da cultura brasileira do Norte e Nordeste.
Também é verdade que os quarenta anos da apresentação da Sala Especial “O Turista Aprendiz” na 18ª Bienal de São Paulo coincide com os quarenta anos de atividade da Galeria Marcelo Guarnieri, que abriu a sua primeira unidade em agosto de 1985 na casa número 1903 da Av. 9 de julho, em Ribeirão Preto. E que esta exposição, que reúne grande parte do material original apresentado na Bienal – cerca de 130 fotografias feitas por Maureen Bisilliat e ampliadas sob a supervisão de Thomaz Farkas – e que ocorre primeiro em São Paulo e depois em Ribeirão Preto, celebra os efeitos do tempo e a alegria desse encontro. É uma celebração que, ao ser concebida como uma exposição realizada nas duas unidades da Galeria, considera o deslocamento como um fator basilar na prática e poética de Maureen Bisilliat, assim como no modo de funcionamento da Galeria.
Maureen Bisilliat
1931 – Englefield Green, Inglaterra. Vive e trabalha em São Paulo, Brasil
Nascida na Inglaterra em 1931 e radicada no Brasil, Maureen Bisilliat é responsável por uma investigação fotográfica de mais de cinquenta anos. Após estudar artes plásticas na França e nos Estados Unidos, estabeleceu-se na cidade de São Paulo na década de 1950, atuando inicialmente como fotojornalista nas revistas Realidade e Quatro Rodas a partir de 1962. Durante os dez anos que trabalhou para a Editora Abril, pôde fotografar em contextos diversos do Brasil, produzindo ensaios que ficaram célebres, dentre eles “Caranguejeiras”, no qual retrata mulheres catadoras de caranguejos na aldeia paraibana de Livramento. A curiosidade por um Brasil ainda desconhecido durante a década de 1960 se associa ao fascínio por obras literárias brasileiras e resulta em um projeto de longa duração que Bisilliat classificou como de “equivalências fotográficas” com a literatura. Produz, entre as décadas de 1960 e 1990, uma série de livros de fotografias que dialogam com as obras de Jorge Amado, Guimarães Rosa, Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto, Ariano Suassuna, Adélia Prado e Euclides da Cunha. Em 1985 expõe em uma sala especial da XVIII Bienal de São Paulo um ensaio baseado no livro “O turista aprendiz” de Mário de Andrade. Na década de 1980, começa a dedicar-se também ao audiovisual, lançando em 1981 o documentário “Xingu/Terra”, filmado com o diretor de fotografia Lúcio Kodato, na aldeia mehináko do Alto Xingu. Foi curadora da Sala Especial XINGU TERRA, instalada na XIII Bienal de São Paulo (1975).
Seu olhar devota uma especial atenção ao fator humano, interesse que pode ser observado na multiplicidade de retratos que compõem a sua obra e no registro das manifestações culturais dos retratados, seja através da vestimenta do sertanejo, da pintura corporal da indígena, da rede do pescador ou da fantasia da carnavalesca. A ideia de equivalência que utilizou para definir seu trabalho com a literatura, norteia também a sua prática através da relação de cumplicidade e troca que constrói com aqueles que retrata enquanto filma ou fotografa. “Forma-se uma cumplicidade natural. Eu não gosto da solidão. Não gosto de trabalhar sozinha”, afirma Maureen.
Maureen Bisilliat foi bolsista da Fundação Guggenheim (1970), do CNPq (1981-1987) e da Fapesp (1984-1987). Em 2010 foi vencedora dos prêmios Porto Seguro de Fotografia, Ordem do Ipiranga, Ordem do Mérito Cultural e a Ordem do Mérito da Defesa. Maureen participou de diversas exposições individuais e coletivas desde a década de 1960, destacando-se: MASP-Museu de Arte de São Paulo, Brasil; MAM-Museu de Arte Moderna de São Paulo, Brasil; MAC-Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, Brasil; XIII, XVIII e XX Bienal de São Paulo, Brasil; I Bienal Latino-Americana; American Museum of Natural History, Nova York, EUA; Musée d’ethnographie de Genève, Suíça; Kunsthaus, Zurique, Suíça; Kunstmuseum Wolfsburg, Alemanha; Museu Afro Brasil, São Paulo, Brasil; IMS-Instituto Moreira Sales, Brasil.